sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Veja como é na verdade uma emergência no cockpit de um avião comercial



todos conhecem como são as notícias de aviação na mídia não é?
Avião faz pouso de emergência em [coloque aqui o aeroporto].
Não houve feridos 
<<< gosto muito desta parte.
Obviamente o resultado é mais gente com medo de voar, e não admira que isso aconteça.
Mas vamos ver como se desdobra uma emergência real, incluindo o corte (desligamento) de um motor em voo. Aconteceu em meados de 2011, e com muita sorte foi capturado em vídeo pelo PilotsEYE.tv, que estava fazendo um documentário para o canal especializado em filmes de cockpit.
Um Airbus A340 da Swiss havia decolado de Zurique em direção a Xangai, e durante a subida a co-piloto verifica no ECAM (uma das telinhas do painel que monitora parâmetros dos motores e status do avião) que a temperatura de óleo do motor 3 estava bem mais alta do que o normal. Como toda tripulação bem treinada em CRM (Crew Resource Management), ambos tripulantes começam a discutir a melhor ação a seguir em relação à pane e qual papel cada um fará (quem comunicará, quem voará, quem monitorará).


                                                                                                                      ECAM mostrando a discrepância


Os checklists são revistos e uma chamada para o setor de manutenção é feita. É percebido também que a temperatura do óleo do IDG (o gerador elétrico do motor 3) também apresenta temperatura anormal. No processo de trouble shooting (pesquisa do problema), desligam o gerador e como a temperatura não diminui, eles o desconectam. Tudo na calma, tudo pensado.
Em determinado momento chamam ao cockpit o terceiro piloto, pois como se trata de uma anormalidade, todos podem contribuir (CRM em toda a sua beleza).
Na imagem acima eu marquei em vermelho a temperatura do óleo e uma seta apontando a pressão do óleo. Uma das belezas da indicação remota de parâmetros é que, com o bom uso da ciência, em segundos você pode definir se uma pane é real ou se é apenas uma indicação errada. Como a pressão de óleo do motor 3 está menor que dos outros motores e sua temperatura está mais alta, na hora já podemos afirmar que se trata de uma pane real.

Como?

imples, a viscosidade de um óleo varia inversamente com sua temperatura. Se a temperatura está mais alta, o óleo ficará menos viscoso e como consequência sua pressão será mais baixa (o óleo estará mais fino).
Bem, a tripulação decide então desligar o Motor 3 para preservá-lo, param de subir e avisam ao controle de tráfego aéreo que precisam alijar combustível antes de retornar a Zurique, para reduzir o peso. O Controle pergunta se o comandante quer declarar emergência e ele informa que não, apenas um PAN (uma declaração intermediária, utilizada quando a urgência a bordo não envolve risco imediato para os passageiros ou para a aeronave).
Mas claro que antes de voltar eles têm que comer um chocolate (suíço, claro) e tomar um cafezinho. Imaginem a possível conversa entre eles:
_Amanhã o G1 vai publicar o nosso pouso de emergência e o pânico a bordo.
_Sim, e também dirá que felizmente não houve feridos e que a manutenção fará uma perícia para descobrir o que aconteceu.

O comandante então avisa aos passageiros que terão que retornar por causa de um problema no motor.
Acharam a tripulação nervosa? Não né, aproveitaram até o tempo de alijamento para explicar ao cinegrafista tudo que estava acontecendo.
Em 99% das vezes é exatamente assim que problemas são geridos em aviões comerciais. O treinamento, aliado aos procedimentos e a confiabilidade na máquina é que faz o voo comercial ser tão seguro hoje em dia, para quem pilota e para quem viaja.
Aproveitem cada segundo do vídeo, com a contribuição e envio do @midiarte.

E se fosse um avião com dois motores ao invés de 4? Ah, isso vai ficar para o próximo post em que falo sobre ETOPS e longos voos sobre a água.

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